Caxias do Sul 23/10/2025

A ponte invisível

O delicado equilíbrio que une trabalho e saúde, vital para empresas e trabalhadores
Produzido por Ciane Meneguzzi Pistorello , 20/10/2025 às 14:26:25
Ciane Meneguzzi Pistorello é advogada, com pós-graduação em Direito Previdenciário, Direito do Trabalho e Direito Digital
Foto: Luizinho Bebber/Divulgação

Entre estações da vida, caminhamos por trilhos que nem sempre vemos. Falo da ponte invisível que une trabalho e saúde, sobre a qual transitam vidas — trabalhadores e empresas — em equilíbrio delicado. Como advogada, observo-a com atenção: é frágil, mas vital.

O trabalhador sustenta a esperança de que seu empenho será recompensado; a empresa deposita confiança no compromisso do colaborador. Contudo, há um elemento que frequentemente balança essa ponte: o advento de uma doença ocupacional. Ela pode surgir devagar, quase sussurrando — um zumbido no ouvido, um formigamento no punho, uma fadiga persistente nos músculos — até corroer a estabilidade de quem exerce sua labuta com dedicação.

Durante décadas, o direito trabalhista exigia regras rígidas para que o empregado tivesse proteção: afastamento superior a quinze dias, concessão de “auxílio-doença acidentário”. Muitos sofreram em silêncio porque não preenchiam tais requisitos — embora adoecessem pelo labor. Muitas empresas, por sua vez, viviam tranquilas, alicerçadas na segurança desses critérios.

Mas, agora, algo mudou: a Tese 125 do TST rompe essas amarras formais. A nova orientação diz que não basta mais cumprir prazos ou esperar os benefícios previdenciários. O que importa — e importa muito — é comprovar o nexo causal ou concausal entre o trabalho e a enfermidade, mesmo após o contrato ter sido encerrado. A ponte invisível, portanto, passa a se firmar num solo menos rígido.

Vejo nisso uma cortina de esperança — e de alerta — para quem lida com pessoas no centro das organizações. As empresas são chamadas a erguer pilares mais sólidos: programas eficazes de saúde ocupacional, mapeamento de riscos, canais de reclamação interna bem estruturados, um olhar real sobre sofrimento psíquico, assédio ou excesso de carga.

E os trabalhadores? Que recebam a oportunidade de que sua dor não seja ignorada só porque faltava um requisito formal. Que possam ser ouvidos, ter perícias que reconheçam relações sutis entre labuta e enfermidade, sem que esperem a ruína para buscar justiça.

Não é uma ponte fácil de construir. Exige confiança, diálogo, compromisso. E exige de nós, advogadas e advogados, o ofício da palavra clara, da argumentação bem lavrada, do cuidado na peça jurídica, mas também na linguagem — para que cada leitor possa entender: direito do trabalho trata de gente.

Se você, gestor ou colaborador, notar que alguém cambaleia nesse caminho invisível — não omita sua atenção. Pois o direito, em sua essência, é ponte de dignidade entre o humano e o justo.

Ciane Meneguzzi Pistorello é advogada, com pós-graduação em Direito Previdenciário, Direito do Trabalho e Direito Digital. Presta consultoria para empresas no ramo do direito do trabalho e direito digital. É coordenadora do Curso de Pós-Graduação Latu Sensu em MBA em Gestão de Previdência Privada – Fundos de Pensão, do Centro Universitário da Serra Gaúcha – FSG.

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