Caxias do Sul 15/06/2025

Resenha da Bíblia

Imagens poéticas advindas do famoso texto bíblico fazem o autor refletir sobre aspectos da Serra Gaúcha
Produzido por Paulo Damin, 13/06/2025 às 09:22:38
Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul
Foto: ARQUIVO PESSOAL

A Serra é um lugar que faz pensar bastante no Eclesiastes:

Eu me voltei e vi

névoa-nada sob o sol

O Eclesiastes, ou Qohélet, na tradução do Haroldo de Campos.

Bom é tradução assim, que a gente não fica com vontade de ir conferir no original. É verdade que não entendo hebraico, árabe, aramaico, grego, latim, mas o texto brasileiro tá tão bom que, sei lá, deixa pra lá o original, com todo o respeito a Elohim.

É um dos livros da Bíblia, o Eclesiastes, como os senhores e senhoras sabem. Viu, vó? Tô lendo a Bíblia!

Imagens poéticas com intenção de ensinamento. Escritas na pedra, na grama, na areia, escritas nas águas do Mar Morto, ressuscitado:

Melhor

uma palma-de-mão cheia

de repouso

que duas mancheias

de fadiga

e fome-vento

Que beleza de conselho onde o trabalho é só que há. Aliás, a única coisa que sei em latim é que trabalho significa problema.

Mas tá, tudo bem. A ideia do Qohélet é essa: tá, tudo bem. A pausa, a vírgula, é o que importa. É a chave da poesia.

Tem outro trecho que lembra não só a Serra, mas o continente, o planeta. Assim:

É névoa-nada

o que se faz sobre a terra.

Há justos que têm a sorte

igual à obra dos iníquos

e iníquos que têm a sorte

igual à obra dos justos.

E eu disse

que também isso

é névoa-nada.

Ou seja, paciência! É cheio de conselhos de paciência, o Qohélet. A parte mais famosa, inclusive, fala sobre a alternância de estações:

Para tudo, seu momento

E tempo pra todo evento, sob o céu

Tempo de rasgar

e tempo de coser

Tempo de calar

e tempo de dizer

Isso é pra ler ouvindo “Turn turn turn”, com The Birds.

Paciência e rock’n’roll. Em janeiro volta o calor.

Talvez eu esteja exagerando. Me passando, como diz o outro-que-sabe, o Qohélet. Talvez já em setembro melhore. Quero aprender a não ser justo em excesso e não me exceder em sabedoria. Pra que provocar minha ruína?

Isso tá no livro, essas últimas frases aí.

E tá no livro também que o negócio é tomar vinho, comer pinhão e se esquentar com a pessoa amada (em tradução minha).

Diz que é por aí a sabedoria.

Paulo Damin é escritor, professor e tradutor em Caxias do Sul.

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