Há limite para uma paixão? Que seja genuína! Verdadeira! Por alguém? Por uma cidade? Pelo trabalho? Por um hobby? Ou para aquela paixão que nos leva quase à loucura para fazer descobertas?
Devaneios esses ocuparam minha mente após a leitura de um artigo na revista Vogue, que relata a premiação gastronômica que Alain Ducasse, aclamado chef francês, recebeu: a terceira estrela Michellin. O restaurante que ele comanda é o Plaza Athénée, hotel parisiense dentre os mais luxuosos.
Chef estrelado – eliminou carnes vermelhas do cardápio. Ménu Naturel. Grãos, legumes e peixes. Uma “trinca” infalível, penso eu. E com histórias – legumes cultivados no “Jardin de La Reine”, no Chateau Versailles. Decerto a magia ali permanece, mesmo depois de séculos passados. Pois em Versailles, a Rainha Maria Antonieta cultivava legumes, verduras e frutas para que seus filhos tivessem uma alimentação saudável, nos anos 1780 - antes da Revolução Francesa. Quanto aos peixes, o Chef somente utiliza os pescados durante a manhã. Os demais ingredientes devem estar frescos e orvalhados.
Ora, poderá imaginar o meu leitor: grãos, legumes e peixes podem ser feitos com inúmeras variações.
Mas... o modo de preparar refeições com esses três ingredientes básicos influiu na conquista de mais uma estrela e assim revelou o grande segredo: a utilização da Técnica Shojin, de origem chinesa, que prega a organização, a concentração total e o silêncio durante o preparo dos alimentos.
Por isso e tanto mais, entende-se perfeitamente por que a Unesco reconhece a culinária francesa como Patrimônio da Humanidade.
A paixão de Monsieur Ducasse pela cozinha e seu amor por Paris faz com que as pessoas sonhem com o bom, o belo e o verdadeiro (desculpem o clichê), sejam elas parisienses ou não. Em alguma refeição, o chef Alain Ducasse senta com as pessoas, revela produtos e histórias de lugares e de escolhas do receituário. Imagino que essa experiência deva ser um “oásis” em tempos acelerados de fast food.
Aplicar essa Técnica Shojin – organização/concentração total/em silêncio absoluto em outras circunstâncias de nossas vidas é um desafio que me proponho por vezes, em circunstâncias possíveis. Transferir esse respeito, organização, concentração e o silêncio (repito) em atividades cotidianas, desde as mais prosaicas até... onde a imaginação o permitir.
Concentrados e em silêncio, podemos viver intensamente. Com doçura, o ínfimo pode se tornar sublime. E tudo pode acontecer como planejarmos. Acredito nisso. Recomendo essa técnica para vivermos mais felizes. Ou seja, termos o controle da fruição das escolhas em nossas vidas. É alta ajuda. Isso mesmo. Alta ajuda.
Proponho: Abaixo a compulsão da pressa. Há um tempo para tudo e esse tempo deve ser respeitado. Uma gestação. A noite. O dia. O desabrochar de uma flor. Um beijo. Um abraço. O ato de amor entre um casal. A feitura de um prato para a família. A leitura de um livro. O degustar de uma taça de vinho...
Pois,
Cada momento, cada emoção acontece em tempo real, neste exato momento. A vida é contínua e natural.
Saber viver é uma arte. C’est la joie de vivre.
Marilia Frosi Galvão é professora, escritora e cronista.
galvao.marilia@hotmail.com
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