Caxias do Sul 03/05/2024

Uma nova era

Da máquina de escrever ao e-book
Produzido por José Clemente Pozenato, 10/03/2020 às 18:00:43
Pozenato guarda como relíquia sua Olivetti, com a qual datilografou o original de "O Quatrilho"
Foto: Marcos Fernando Kirst

Meus primeiros poemas e contos, quando ainda adolescente, escrevi com caneta tinteiro: a “Parker 51”, que era um avanço sem tamanho. Antes dela, era preciso ter a caneta e o tinteiro, cuidando para não pingar nem derramar, que foi o que usei na escola primária e no ginásio. Quando tive o primeiro salário, o mundo mudou: comprei uma máquina de escrever “Olivetti – Studio 44”, em doze prestações. Nela escrevi, entre outras tarefas acadêmicas, o romance O Quatrilho e a novela O Caso do Martelo. Do primeiro, ainda guardo uma cópia datilografada e encadernada, graças aos cuidados de minha esposa.

No Rio de Janeiro, enquanto acertava a adaptação de O Caso do Martelo para a televisão, o Antônio Calmon, que era roteirista de novelas da Globo, me incitou a usar o computador para escrever: “é mais fácil de apagar e de emendar”, me disse ele. Só era preciso ter um aparelho de salvar o que se escrevia, um “back-up”. Isso, dizia ele, porque se um texto some de repente, você tem vontade de jogar o computador pela janela. Pois bem, comprei um computador, também em prestações, mais o aparelho de “back-up”, que logo saiu de moda com a chegada do disquete. Mas confesso que durante um bom tempo continuei escrevendo na “lettera 22”, enquanto via o computador me vigiando ao lado. Até que um dia decidi superar o medo – instalado em mim pelo Calmon – e escrever, isto é, digitar nele. E gostei. Como dissera meu amigo, era mais fácil fazer cortes e emendas.

Sair da máquina de escrever e do computador para o livro impresso foi outra experiência inesquecível. Lembrei-me então da era inaugurada por Gutemberg, quando inventou a máquina de imprimir em papel. Acabou com os amanuenses e os copistas. Mas permitiu que cópias dos livros pudessem entrar dentro das casas dos leitores, e não apenas ser depositadas nas bibliotecas. Com o livro impresso vivi uma era de fastígio, como se dizia uma vez. Dezenas de edições, milhares de exemplares vendidos, um número sem fim de autógrafos solicitadosem feiras e outros eventos. Até que o fluxo começou a diminuir. O que era antes um rio caudaloso virou uma torneira de difícil manejo. A era das grandes editoras começou a sumir dentro da nuvem da internet.

Pois bem, devo anunciar que – depois da era da caneta tinteiro, da era da máquina de escrever, da era do computador, da era do livro impresso pelas editoras – acabo de entrar numa nova era: a do “e-book”. É para onde estão migrando todas as editoras e para onde estou migrando também. Em alguns meses, o leitor poderá me encontrar nessa nuvem.

* José Clemente Pozenato é escritor e autor do aclamado "O Quatrilho", que foi adaptado ao cinema, concorrendo ao Oscar.

e-mail: pozenato@terra.com.br