Caxias do Sul 05/05/2024

A constelação dos agricultores

As feiras de sexta no bairro Cruzeiro proporcionam uma viagem intergaláctica a outros universos
Produzido por Paulo Damin, 03/12/2022 às 08:35:06
Foto: ARQUIVO PESSOAL

Entre a Antares e a Sírius, está a Camaleão: uma constelação em que se pode escutar talian e hunsrik. Se a gente sabe falar essas línguas, a chance de conseguirmos desconto na bergamota e no queijo se expande estratosfericamente. É um método científico que aprendi desde meus tempos de supernova, porque minha nona me levava toda semana na feira do bairro Cruzeiro, onde as ruas têm nomes de astros que duram mais do que quinze minutos de fama.

A feira do agricultor, para a nona, era um grande movimento de translação. Ela ia que nem estrela, fazendo várias heliopausas para cumprimentar bem mais do que Três Marias. Distribuía beijos com seus astrolábios e percorria todo o meridiano para comprar betelrabas e aldemaçãs no Seu Zênite. Depois, recuava meio raio atrás das abóboras celestes de Dona Nadir. Aí voltava a avançar até o centro da massa. Eu, poeira cósmica, apenas orbitava em torno dela.

Anos-luz atrás eu fui na feira com uma namorada cometa do paralelo 30, porque caxiense que se preze impressiona as extraterrestres com os frutos de sua colônia espacial. Ela era de Touro e comprou tanto π-mentão que tivemos que voltar para casa na nave Agrale de um feirante.

Engana-se quem, de longe, vê aquele caos e acha que vai ser sugado por um buraco negro. Mas tampouco é preciso ser físico da NASA para entender as rotações na feira dos agricultores. Existe uma divisão simples naquela Via Láctea. De um lado, fica o polo de jaleco verde, em que gravitam os produtores da própria Terra. Do outro, fica o polo de jaleco azul, em que se posicionam os asteroides que revendem produtos de outros campos magnéticos. Todos, no entanto, prestam tributos a Ceres e Mercúrio.

Para todo alienígena que me pergunta o que fazer em Galacxias, eu indico a rota do Cruzeiro: sextante à tarde, atrás do ponto cardeal católico. Não tem erro de cálculo nem risco de desastre. A feira funciona mesmo em dias de tempestade cósmica. E, em troca de uma cerveja puro Marte, me ofereço para ser guia de qualquer mochileiro com toalha na mão.

Aproveito para convidar os terráqueos e alienígenas a participarem da leitura dramática da minha peça “A Rainha está Viva”, no Zarabatana Café, dia 17/12, às 19 horas. É um sábado. Que na sexta tem feira.

Paulo Damin é escritor e tradutor em Caxias do Sul.

Do mesmo autor, leia outro texto AQUI