Caxias do Sul 18/05/2024

Dores exigem que nos ampliemos

A pior dor é a que a gente sente, é a daquele momento difícil
Produzido por Neusa Picolli Fante, 28/02/2023 às 08:24:43
Foto: Morgane Coloda

Existem situações difíceis na nossa vida - na de todos nós. Diferentes situações, diversos desafios a nos desacomodar.

Lidar com esses momentos turbulentos, ou se atrapalhar nesse movimento, faz parte... Afinal, dor não é brinquedo. Dor é dor! E gera emoções e atitudes tempestuosas para os desavisados, ou melhor, para os desconhecedores de como lidar com esses sentimentos invasivos, difíceis, duros.

Quando a dor e o conflito são tantos que não cabem em nós, existe a necessidade de aprendermos a nos ampliar, expandir, crescer, abrir espaços para acomodar, para no meio disso tudo conseguirmos nos refazer sem sucumbir àquela dor - que nos pegou de surpresa, no imprevisto, ou que está ali assolando nosso ser... Não querer vê-la é jogar contra nós, é correr o risco de ser destroçado por ela, quando menos imaginarmos.

Um dos erros que mais se cometem no senso comum é que a dor é única e igual para todos. Se assim fosse, deveríamos tratá-la da mesma maneira, ou seja, uma única fórmula auxiliaria a todos nós. Mas, vamos olhar de outro jeito: a pior dor é a que a gente sente, é a daquele momento difícil. Assim, toda dor deve ser olhada com carinho, até porque ela passa por questões individuais nossas, o que pode torná-la mais difícil e complexa.

Como podemos compreendê-la? Indo ao encontro de pessoas, de entendimentos, de informações que nos dão suporte para acolher a angústia sentida e o não direcionamento desse momento.

Sim, quando não sabemos como sentir e o que fazer, ficamos presos a sentimentos que nos impedem de dar o próximo passo. É ali que necessitamos de discernimento para nos redirecionar.

Então, fica evidente que não é a dor que diminui, ela continua igual, no mesmo formato e tamanho que era e que sempre foi. Sou eu, ser humano, que preciso me expandir, crescer, me desenvolver, tentar compreender o ocorrido e a existência desse desamparo. Ou seja, o peso dele sobre mim, suas razões e a minha busca... Assim, vou me alargando, ficando mais fortalecido para dar conta daquela dificuldade.

Isso é deixar a dor ventilar, para que ela vá se gastando devagar, e ocupe um lugar menor na minha/nossa vida.

Com relação à dor do outro, que por vezes muito nos abate e nos sentimos na obrigação de fazer algo, para transformar, diminuir, talvez, preciso ter em mente que só posso tolerar escutá-la. Não me cabe fazer pelo outro, tirar a experiência e o aprendizado dele. Isso porque não é meu papel diminuir a dor de quem sofre ali do meu lado, é meu papel autorizá-lo a sentir e a falar do que o aflige, a expressar seus sentimentos e acolher esse momento áspero que ele vive.

Não olhar para o desamparo que sinto é deixá-lo presente, alfinetando-me internamente. Colocar uma pedra em cima, como algumas pessoas dizem, é correr o risco de que a pedra escorregue e que aquele sentimento todo volte numa intensidade muito maior, pelo tempo que permaneceu enclausurado...

Converse com a sua dor e dê escuta à dor do outro também. Não tenha medo de aprender a se acolher e a solicitar ajuda... Desenvolva a compaixão pelo outro, sem interferir no que não te pertence da história dele. Sempre tem alguém que sabe mais que você e que pode lhe auxiliar... E assim você e o outro vão ao encontro do caminho da transformação...

Neusa Picolli Fante é psicóloga clínica especialista em lutos e perdas. É palestrante e escritora, autora de oito livros: três de psicologia, três de crônicas e dois de poesia.

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